

A taxa de abstenção nas eleições presidenciais da Guiné-Bissau, realizadas no passado domingo, poderá chegar aos 40 por cento, segundo dados avançados ontem pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE). As fortes chuvadas e a recorrente situação de instabilidade no país terão sido os principais factores a contribuir para o alheamento dos eleitores.
A votação de ontem para escolher o novo presidente da Guiné-Bissau decorreu com normalidade mas sem grande afluência de eleitores. A Comissão Nacional de Eleições confirmou o alheamento dos cidadãos, mais notório na capital, Bissau.
O Presidente da República, Raimundo Pereira, inaugurou sexta-feira, 19 de Junho, num ambiente de grande festa, a Ponte Euro-Africana em São Vicente sobre o rio Cacheu, no norte da Guiné-Bissau.A nova ponte é encarada como uma infra-estrutura de vulto que pretende facilitar o trânsito das mercadorias importadas diariamente dos países vizinhos, Senegal e da Gâmbia.Apesar do enorme tráfego de produtos oriundos do Senegal e da Gâmbia a travessia do rio Cacheu não permitia o desenvolvimento deste fluxo apenas garantido por jangada que assegurava a travessia, até à quarta-feira, dia em que estava reservada ao público.O estado precário da jangada já não permitia assegurar com regularidade e segurança o transporte através de camiões de uma margem para outra, provocando significativos atrasos. A ponte inaugurada permitirá aumentar o tráfego de produtos, alimentares e domésticos, para a Guiné-Bissau, rendendo ao Estado guineense milhões de francos Cfa, através dos serviços aduaneiros.Para o representante da União Europeia na Guiné-Bissau, embaixador Franco Nully, «a construção desta infra-estrutura rodoviária, não resolve por si só, os problemas da Guiné-Bissau. Estes resolvem-se com boas políticas de governação e com a construção de um clima de paz, de unidade e da estabilidade».A cerimónia da inauguração da ponte Euroafricana, contou com as presenças do Secretário Executivo da CPLP, Ministro dos Negócios Estrangeiros da Gâmbia, Ministro da Defesa do Senegal, Representante da UEMOA e do Presidente da Republica interino Raimundo Pereira. Características: A ponte tem 730 metros, duas faixas de circulação com 3,5 metros e dois passeios de 1,50 metros de largura. A profundidade dos pilares no rio oscilam entre 42 a 75 metros, construídos em betão armado de 1,60 m de diâmetro, cofrados com tubos metálicos da mesma profundidade
Sempre deu o corpo ao manifesto. Para quê? Para ajudar o MPLA a implementar o seu programa de Governo. Mas, quando menos esperava, o líder do partido para o qual milita desde os 20 anos de idade apeou-o inopinadamente do poder e, como paga, virou-lhe as costas. A ligeireza do click do teclado do computador, ligado à Internet, viabilizou a presente entrevista com Marcolino José Carlos Moco que nos serve, já a seguir, uma sobremesa de criticas, observações e chamadas de atenção sobre o estado do Estado angolano.
dispositivo das Nossas Tropas (NT) na região do Boé transferindo o aquartelamento de Medina para local mais adequado na região do Cheche.
mo-sa, por forma a obter o rápido reordenamento e instalação das tabancas em autodefesa. respeitando-se o princípio da concentração de meios;
todas as implicações resultantes deste movimento, nomeadamente o seu enquadramento numa operação a realizar na data do abandono da ilha. O planeamento desta operação compete à Força Aérea. Bissau, o comandante-chefe, António Sebastião Ribeiro de Spínola, brigadeiro.6)
1. O sistema de rotação de unidades que vem sendo adoptado pelo CTIG satisfaz como solução justa, no que respeita à divisão equitativa do esforço do pessoal, mas tem o grave inconveniente de afectar muito sensivelmente a continuidade de acção das unidades, e consequentemente o rendimento operacional do conjunto.
meios. Reajustar os limites entre as companhias de Xime (destacamento de Finete) e de Porto Gole (destacamento de Enxalé). Reajustar o dispositivo da companhia com sede em Quelifá, recolhendo aquela companhia e pelotão destacado em Ponate, e rectificar o limite das zonas de acção das companhias de Canquelifá e Piche. Reajustar o dispositivo do batalhão de Nova Lamego, em ordem a possibilitar uma acção dinâmica permanente na área de Chanha. Transferir, em fase ulterior, os estacionamentos das NT de Gandembel e Guilege, para Salancaur e Nhacobá, devendo proceder-se, desde já, ao estudo da localização e das vias de comunicação.
dos seguintes factores principais: características da missão (dinâmica ou estática); tipo de reacção do IN na área (reacção em força ou reacção fugindo ao combate); extensão da área de responsabilidade e natureza do terreno; valor da população e seu comportamento.
isto é, devem entrar em sector. Estas subunidades, embora em sector, são «pedras de manobra» dos comandos de batalhão para a realização de operações na sua zona de acção. Não se exclui, todavia, a hipótese de poderem ser atribuídas forças de intervenção aos comandos do sector para execução de operações nas suas áreas, em cumprimento de missões normais ou das que especificamente lhes forem determinadas. Na presente fase de disponibilidade de meios, o conceito puro de forças de intervenção só tem aplicação ao nível comando-chefe, que centralizará todos os meios de intervenção da Guiné, nomeadamente: potencial de fogo da FA (ZILIFA e ATIP); batalhão pára-quedista; fuzileiros especiais; comandos; batalhões e companhias independentes, a nomear.
proposta sobre sa condições de utilização de rede fluvial por parte dos nativos, e o a procedimento a adoptar em cada uma das zonas do TO em matéria de fiscalização e disciplina do tráfego de canoas
o reabastecidas por via aérea, no caso de impossibilidade da via terrestre. d) Em qualquer caso, fica interdito a fixação a priori do prazo de duração das operações, o que evidentemente não implica que no planeamento não se considere, em previsão, determinado prazo.
junto às linhas de água; não se adaptam as formações de combate ao terreno, de que resulta as NT deslocarem-se em permanente ambiente de insegurança; não se estabelece uma conveniente ligação entre as forças intervenientes na acção; o pessoal não se mantém em alerta permanente, pronto a reagir rapidamente a qualquer acção do N; as tropas não observam, não escutam, e não reconhecem os trilhos que se encontraram no itinerário de marcha; o pessoal não transporta as armas em condições de pronta utilização; o pessoal fuma, fala, come e bebe durante o movimento, não cumprindo o princípio da economia de esforço, do que resulta esgotar-se prematuramente; rigidez no cumprimento de um horário pré-estabelecido, de que resulta a tropa deslocar-se com uma velocidade exagerada, esgotando-se prematuramente; não se escolhem devidamente os locais para os pequenos ou grandes «altos»; quando se pára não se monta a segurança próxima; não se marcam os sectores de tiro e de vigilância; utiliza-se no regresso o itinerário utilizado na aproximação.
l que satisfaça os anseios imediatos das populações, anseios que lhes foram instigados pelo inimigo e que estão na base da sua propaganda, constituindo a sua principal força.
companhias, em conformidade com o seu conceito de operação, submetendo-as à aprovação superior; fiscaliza a actividade operacional das companhias, em ordem a assegurar o cumprimento das respectivas missões: garante a necessária assistência técnica às companhias, em especial quando comandadas por oficiais menos capacitados (equipas itinerantes - Directiva N.° 23/68); planeia e coordena operações no quadro do conceito operacional do batalhão; garante às companhias os meios necessários à sua actividade operacional normal, reforçando a acção na respectiva área quando necessário, e) Comando de companhia. garante, em continuidade, a actividade operacional na respectiva zona de acção, no quadro da missão recebida, por cujo cumprimento é totalmente responsável; providencia junto do comando superior, no sentido de lhe serem atribuídos os meios de reforço julgados indispensáveis para o cumprimento da missão.
os adjuntos para as informações e operações especiais. Esta reunião deve desenvolver-se na seguinte base: implantação na carta da situação (1/50 000), de toda a actividade operacional do último período (uma semana); implantação, na mesma carta, da actividade operacional dos últimos seis meses, o que obviamente implica o levantamento semanal da sinalização referente ao da semana excelente; descrição sumária da semana; crítica ao rendimento operacional obtido; resultados práticos obtidos; implantação da actividade operacional, numa carta à escala 1/1.000.000, a arquivar em pasta própria; análise da actividade anterior das NT por consulta da pasta anteriormente referida.
lementos que declarem só desejarem prestar informações à PIDE não devendo, em qualquer caso, ser exercida pressão sobre os mesmos; as autoridades locais administrativas e militares devem explorar imediatamente qualquer informação de carácter urgente e interesse local que lhes seja fornecida.
Vinte associações militares de combatentes das Forças Armadas reuniram-se ontem em Lisboa, naquele que foi o Segundo Congresso de Combatentes, 36 anos após o primeiro, realizado em 1973.
mento começou em Portugal, na antiga Casa dos Estudantes do Império, através do Movimento Anti-Colonial (MAC), que depois se desdobrou pelos vários movimentos de libertação. Quando" ele chegou à Guiné, começou logo a organizar a luta. É curioso referir que, inicialmente, ele não queria que eu participasse. Não me dizia isso directamente, mas sim à mulher dele, Helena: «Não vou meter o Luís nisto, porque ele fica de reserva, para dar assistência à família. » Mas, por volta de 1955, quando o Amilcar saiu da Guiné, de novo para Portugal, já eu estava ligado a estas coisas.
da PIDE em Lisboa. Este procurou saber o nome de um africano, já com idade razoável, que se tivesse destacado no dia da greve. O homem de Bissau foi procurando e acabou por chegar ao Carlos Correia, que tinha alguns estudos, trabalhava na CUF e que teve o tal incidente com a polícia. Decidiram prendê-lo. Nós já tínhamos as nossas redes. Uma das pessoas que esteve muito ligada ao início da luta foi uma farmacêutica portuguesa, Sofia Pomba Guerra, que me mandou avisar que o Carlos Correia ia ser preso. Saí de Bissau à procura dele. Encontrei-o e fi-lo sair da cidade nessa mesma noite. No dia seguinte, às oito da manhã, a PIDE foi à Casa Gouveia prendê-lo, mas ele já lá não estava. O massacre de Pidjiguiti alertou as nossas consciências, porque a situação social, em Bissau, era complexa. Havia um grande número de indivíduos africanos que se sentiam numa situação mais ou menos privilegiada, em relação à grande massa da população da Guiné. Mesmo no meio dos originários de Cabo Verde não era muito fácil fazer a mobilização, porque muitos indivíduos já tinham uma posição mais ou menos favorável. Penso que havia uma certa contradição ao nível dessa pequena-burguesia africana. Os cabo-verdianos vinham de Cabo Verde com um nível cultural superior ao dos indivíduos da Guiné e ocupavam cargos na função pública e na administração. Os guineenses - naquele tempo não havia liceu em Bissau - viam os outros chegar e ocupar os lugares. A esse nível, eu penso que, mesmo nessa altura, já existia uma certa fricção. Mas, ao nível do movimento de libertação, isso não tinha significado. O partido foi fundado por guineenses e por cabo-verdianos e embora quer eu quer o Amílcar, quer outros, sejamos de origem cabo-verdiana, isso não impediu que a grande massa do povo tivesse aderido à nossa luta. Basta ver que, mesmo assassinando o Amílcar, foi possível manter toda a estrutura da direcção do partido. E houve um apoio em massa a Aristides Pereira, para o cargo de secretário-geral, liderando eu todo o processo da sua candidatura. E ele nem nasceu na Guiné.
O Amílcar teve conhecimento imediato dos acontecimentos de Pidjiguiti, em Agosto de 1959. Nós fizemos seguir um comunicado para ele, o que não foi difícil, porque o Fernando Fortes era director dos serviços postais. Metia a nossa correspondência depois de os sacos estarem oficialmente fechados. Assim, no dia a seguir ao massacre de Pidjiguiti, rádios como a BBC e a Voz da América leram o nosso comunicado. A PIDE já tinha indícios de que havia um movimento clandestino. Em 1960, o meu irmão foi a Tunes, ligado ao Movimento Anti-Colonial (MAC), que depois deu origem à Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas (CONCP). Decorria a II Conferência Pan-Africana e ele apresentou-se com um nome falso, Abel Djassi. Foi essa a nossa primeira presença no movimento pan-africano. De Tunes, o Amílcar seguiu para Londres, onde deu a primeira conferência de imprensa de um nacionalista oriundo das colónias portuguesas. Depois passou em Dakar, exactamente no mesmo dia em que lá cheguei, fugido de Bissau. A minha fuga ocorreu ainda em I960, quando foi inaugurada a sede da Associação Comercial de Bissau, com a presença de alguns administradores da CUE. Um desses administradores telefonou para Lisboa, pedindo que recrutassem um guarda-livros, porque eu ia ser preso pela PIDE. Tinham conseguido que a minha prisão fosse adiada, para que eu fechasse o ano comercial. O Aristides Pereira ouviu a conversa. A minha fuga foi, de imediato, preparada. Contei com a ajuda de um português antifascista, Fausto Teixeira, que estava deportado na Guiné, e que me levou de carro, durante a noite, até à fronteira com o Senegal.
decidiu dar-nos armas para a nossa luta foi o rei de Marrocos, Mohamed V. Ele tinha lutado contra os Franceses, até à independência e, por isso, estabeleceu como um dos pontos principais da sua política a descolonização de África. Em Marrocos, tivemos sempre autorização para fazer entrar o nosso material, o que não aconteceu, durante muito tempo, na República da Guiné-Conakry. O apoio da República da Guiné ao PAIGC foi ganho todos os dias, com a nossa insistência. Quando começaram a chegar as armas, a Guiné não autorizava a entrada no seu território. Nessa altura, eu era o homem encarregado do abastecimento, da logística das Forças Armadas e recorria a tudo para conseguir levar as armas a Conakry e de Conakry até à Guiné. Usámos expedientes como, por exemplo, transformar sofás para levar metralhadoras lá dentro. Depois, apercebi-me de que o homem só tinha a capacidade de calcular o peso até uma determinada altura e, a partir daquela altura, tanto fazia que fossem quinhentos quilos, como três mil. Quando chegavam as armas a Rabat, seguíamos, sem escolta militar, para a garagem das nossas instalações naquela cidade, e era ali que fazíamos as embalagens clandestinas para entrarem em Conakry. O transporte era sempre de barco. Lembro-me de uma vez que o Abílio Duarte foi a Rabat para acompanhar até Conakry um carregamento de granadas, que seguiam disfarçadas em caixas de medicamentos. Colocávamos granadas até determinada altura das caixas, pondo mais à superfície os medicamentos. Como tinham o rótulo de «FRÁGIL», seguiram no camarote do Abílio, que passou todo o tempo de sentinela, porque o seu companheiro de camarote fumava. As granadas também eram muitas vezes transportadas em caixas de tinta Gestetner. Tiravam-se os tubos, transportados em sacos, e colocávamos as granadas dentro das caixas. Os detonadores e tudo o que era explosivo eram transportados em pacotes de cigarros LM, a marca que Amílcar fumava. Tiravam-se os maços de cigarros e colocavam-se os detonadores. E foi assim que fomos levando o material para Conakry, até ao dia em que fomos descobertos e presos. Tudo aconteceu por causa de latas de sardinhas, que tinham balas. Nas minhas camuflagens, em Rabat, costumava embalar balas em caixas de sardinhas portuguesas. Mas esqueci-me das carências que havia em Conakry, onde havia falta de tudo. Quiseram roubar as sardinhas no porto e saíram as balas. Todos os membros do PAIGC que estavam em Conakry foram presos. Entre eles, Aristides Pereira, Vasco Cabral, Pedro Ramos e eu próprio. Como nós prevíamos sempre essa hipótese, sempre que estavam para chegar barcos com armas para nós, fazíamos sair o Amilcar. Dessa vez, ele estava em Rabat. Os angolanos que estavam em Conakry connosco saíram logo para avisar o Amílcar, que iniciou logo diversos contactos no sentido de mobilizar a opinião africana a nosso favor, sem entrar em conflito com a República da Guiné. Estivemos presos cerca de um mês. As autoridades de Conakry queriam que o Amílcar regressasse, como condição para sermos postos em liberdade. Mas eu respondi que, se havia razões para estarmos presos, seriam mais fortes ainda para Amílcar Cabral ser preso.*-
um impacte terrível. Por isso é que a guerra parou, depois de termos os Strela. Os mísseis Strela chegaram pouco tempo depois da morte do Amlcar (Janeiro de 1973) e foram fruto da última missão que ele realizou. Deslocou-se à União Soviética e conseguiu negociar o envio dos mísseis. Fomos, como se sabe, os primeiros a utilizá-los. O Amílcar, com o seu relacionamento pessoal, conseguiu sempre interessar pessoalmente os funcionários soviéticos pela nossa luta. Por exemplo, sabia que um coleccionava selos e, quando viajava pelos países de África, arranjava sempre selos para esse funcionário. Outro gostava de estatuetas africanas, e ele não se esquecia. Isso motivava as pessoas. Foi assim que um desses amigos nos avisou que havia os Strela e que havia grandes hipóteses de os conseguirmos. O Amílcar foi então a Moscovo negociar essa entrega. Quando a delegação do comité soviético de solidariedade afro-asiática foi ao funeral do Amílcar, anunciaram-nos que tinha sido dada autorização para essa entrega e que devíamos organizar um primeiro grupo para receber instrução. Esse grupo foi dirigido pelo Manecas dos Santos. O impacte dos mísseis nas tropas portuguesas foi terrível. Todos os planos do general Spínola se baseavam na superioridade da aviação e, quando começaram a ver cair os aviões, descobriram que não tinham planos. Agora eram atacados à luz do dia. Estavam só habituados aos nossos ataques nocturnos e, quando começaram a cair os primeiros aviões, deixaram de aparecer. Esta foi uma fase decisiva.
Quando se deu o ataque eu não estava em Conakry e o Amílcar também não, mas apenas por coincidência. Começaram a circular informações em Conakry que apontavam para uma tentativa de derrube de Sekou Touré. Ele chegou mesmo a chamar o Amílcar e a dizer-lhe que sabia que estava a ser preparada uma tentativa de golpe, a partir de Bissau, e pediu-lhe para tentar saber qualquer coisa. A família do Amílcar estava lá quando foi a invasão. Aliás, foi disparado um tiro de bazuca contra a casa dele e a viúva ficou sempre a sofrer dos ouvidos, por causa do barulho da explosão. Durante muito tempo, conservámos o buraco na casa. Os guardas da casa do Amílcar responderam imediatamente e os atacantes recuaram. De facto, quem resistiu ao ataque fomos nós. Sekou Touré reconheceu isso em vários discursos. Quem tirou os comandos da central eléctrica foram os nossos homens, comandados pelo Constantino Teixeira, que foi mais tarde ministro do Interior da Guiné-Bissau. Só no dia seguinte, de manhã, é que o Exército guineense respondeu. O chefe de Estado-Maior do Exército guineense foi preso com vários outros oficiais, por cumplicidade com a tentativa de golpe. Um dos comandantes dos nossos barcos estava no seu barco, no porto de Conakry, quando viu, ao largo, comandos a matar gente num outro barco. Conseguiu fugir e foi avisar o Estado-Maior das Forças Armadas. Alertou a sentinela e seguiu logo para as nossas instalações, para avisar também. Quando a sentinela subiu para fazer o aviso, o Estado-Maior estava reunido com os comandos invasores. Mandaram chamar o nosso comandante, Irénio Nascimento Lopes que, no entanto, não ficou à espera quando percebeu. Havia um grande complot interno. Alguns dos oficiais portugueses foram mesmo recebidos por membros do Governo e andaram a passear de Mercedes pelas ruas de Conakry.
uma vida paralela em Conakry - até com mulheres e casa - sem terem salário, porque nenhum de nós tinha salário. Toda essa gente acabou por criar uma vida paralela, que não se podia aguentar se não fizessem os desvios das coisas que faziam. Esses indivíduos acabaram por ver a grande saída. Foi por isso que, quando assassinaram o Amílcar e prenderam o Aristides Pereira, tentaram sair para Bissau mas foram interceptados por um barco soviético, a pedido do Sekou Touré. Foram feitas várias tentativas para destruir o partido, até chegar ao ataque a Conakry, operação de um comando especial orientado directamente pelo general Spínola para atacar a capital de um país estrangeiro, derrubar o Governo e destruir a direcção do PAIGC. Depois do fracasso desse ataque a Conakry, a tentativa seguinte seria tentar destruir o PAIGC por dentro. Foi isso que nos levou a crer que, numa lógica de guerra, de procurar destruir o inimigo, o general Spínola teve a sua participação nisso. Nessa lógica, admito que sim, mas não tenho provas concretas disso. Ele, de facto, nunca procurou o encontro com o Amílcar, nunca procurou compreender a luta do PAIGC, a razão histórica dessa luta no quadro geral da libertação de África.
Unidas. O convite à delegação das Nações Unidas ainda foi feito por ele, mas como documento fundamental na proclamação do Estado. O que nós queríamos era que as Nações Unidas reconhecessem a existência do Estado, dum Estado independente como parcela dum território ocupado por forças estrangeiras. Mudar a nossa condição de colónia com parte do território libertado para a condição de Estado soberano com parte do. território ocupado. Foi isso que foi feito com a declaração da independência. O meu irmão morreu em janeiro e eu tive de tomar as coisas em mãos, mostrar a força do partido, mesmo depois do desaparecimento dele. Naquele período que se seguiu ao assassinato dele, os helicópteros sobrevoavam com altifalantes: «A guerra já acabou!», «O homem que arranjava as armas já morreu!» Aproveitaram para fazer propaganda, aproveitaram o acontecimento. Garantiam mesmo: «A guerra acabou!» Em resposta, lançámos grandes operações militares para mostrar a força do partido - tanto no Norte, contra o quartel de Guidage, como no Sul, contra o quartel de Guilege. Este último foi abandonado, mas nós não tirámos todo o proveito que era possível tirar disso. Esse plano foi feito pelo Amílcar, um ano antes de ser assassinado, e implicava atacar o quartel de Guilege, manter emboscadas na estrada de Guilege-Gadamael, que era o porto, e depois atacar as tropas quando abandonassem Guilege a caminho de Gadamael e, finalmente, concentrar as forças e atacar Gadamael. O comando português que lá estava esperava isso, o plano era tão lógico que eles esperavam isso.
estrangeiros. Por exemplo, os jornalistas senegaleses não puderam vir. Mandaram pedir que se lhes enviasse as cassetes gravadas para poderem pôr no ar ainda nesse dia. Assim, naquele mesmo dia, à noite, as emissoras anunciaram a proclamação do Estado. Fomos reconhecidos imediatamente por cerca de oitenta países. Outros, como a Suécia, não nos reconheceram logo para poder continuar a ter uma certa influência junto do Governo português. Fomos reconhecidos por quase todos os países do Terceiro Mundo.
que esse responsável de segurança tinha vindo ali à região do Canchungo, para fazer uma cerimónia ali ao deus da área, que é o Irã de Cobiana, o grande deus da floresta. Mas ele, para fazer essa cerimónia precisava de aguardente de cana. Era preciso arranjar-lha o mais depressa possível que ele, fazendo a cerimónia, ia-se embora. Então, o general Spínola mandou comprar aguardente de cana e deu-a à malta para a cerimónia. Havia um aspecto de desprezo pelos nossos ideais, de tal maneira que pensavam ser possível com uma garrafa de whisky, até mesmo com umas contas e uns brincos, desviar aqueles homens dos seus ideais de libertação e de independência. Esses oficiais portugueses acabaram por ser mortos porque foram lá para assistir à rendição das nossas tropas. Foi feita uma emboscada e foram mortos. Isso não estava nos nossos planos. O plano era prender o general Spínola. Depois, a malta convenceu-se que o general Spínola não vinha. Como naquela área não tínhamos abastecimentos regulares, nem coisas para conservar esses oficiais, estávamos quilhados. Ou apanhávamos o general Spínola ou então não saía ninguém daqui. De outra vez, houve uns nossos que foram a Bissau, mandados por nós, como se se tivessem entregado. Pensavam que, como era hábito, o general os iria levar de helicóptero para ver melhor as aldeias da Guiné. Eles pensaram obrigar o helicóptero a descer, quando sobrevoasse uma região próxima de uma área controlada por nós. Mas essa missão não se concretizou. Nunca planeámos qualquer acção para matar o general Spínola. Nós sabíamos que, se ele fosse morto, seria substituído por outro. A nossa luta passava pelo desgaste das tropas coloniais, a par do avanço da nossa mobilização. A nossa luta foi sempre avançando, sempre avançando. A retaguarda é que criou os elementos fracos. Queriam viver em Conakry, onde tínhamos armazéns cheios. Como lá havia carência de tudo, começavam a desviar coisas para o mercado negro, para arranjar mulheres e arranjar casas. Foi essa retaguarda que forjou toda a conspiração contra o partido e contra o Amílcar. Nunca houve qualquer cisão no nosso partido. Amílcar escreveu: «O nosso partido é um corpo vivo, em crescimento. Temos de ser capazes de lhe dar a roupa que corresponde a cada etapa desse crescimento. » Um sociólogo americano, Ronald Chilcote, disse uma coisa muito bonita sobre o Amílcar: «Ele faz a luta como faz agricultura. Primeiro, os fertilizantes, depois as sementes, a poda. » E era verdade. Tínhamos já um grupo de militantes que estavam a ser treinados para pilotos na União Soviética. Foram para lá ainda em vida do Amílcar. Era para pilotarem aviões MiG. Seriam a base da força aérea da Guiné independente. 1)1) - Testemunho oral: Luís Severino de Almeida Cabral. Lisboa 13 de Janeiro de 1995. Irmão de Amílcar Cabral, nasceu em 1931. Foi um dos fundadores dp PAIGC e presidente da República da Guiné-Bissau. Foi derrubado em 1979 por um golpe de Estado chefiado por Nino Vieira. Vivia em Portugal quando foi entrevistado.
BIBLIOGRAFIA
A Guerra de África (1961 - 1974)
José Freire Antunes - Circulo dos Leitores - VOL. I