sábado, 6 de junho de 2009

NOTÍCIAS





Hélder Proença e Baciro Dabó assassinados por militares
Ex-ministros estavam marcados para morrer
Os antigos titulares das pastas da Defesa e da Administração Territorial foram acusados de tentar levar a cabo um golpe de Estado e terão perdido a vida quando resistiam à detenção
Na véspera do início da campanha para as Presidenciais antecipadas de 28 de Junho, e três meses após os assassinatos do presidente Nino Vieira e do chefe das Forças Armadas, general Tagmé Na Waie, o Exército da Guiné-Bissau abateu ontem a tiro o antigo ministro da Defesa Hélder Proença e o ministro da Administração Territorial e candidato à presidência Baciro Dabó. Segundo comunicado oficial, ambos estavam ligados a uma tentativa de golpe de Estado e morreram em incidentes separados quando resistiam à detenção.
Esta versão é posta em causa por vários sectores. Os dois antigos ministros eram próximos de Nino e, segundo defendeu Soares Sambú, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, todos os que fossem aliados do antigo presidente integravam uma lista de alvos a abater. Além dele, na lista estariam os ministros assassinados e figuras como Marciano Barbeiro, Daniel Gomes, Issufo Sanhá, Isabel Buscardi, Roberto Cacheu e o empresário Manuel dos Santos (‘Manecas’). O comunicado ontem emitido pela Direcção-Geral de Informação do Estado refere Cacheu, Barbeiro e Gomes entre os supostos implicados no golpe. Todos serão entregues à Justiça, frisou Zamora Induta, chefe interino das Forças Armadas.
fonte na Guiné manifestou igualmente dúvidas quanto à versão oficial. Em declarações ao Correio da Manhã, considerou 'estranho' que estes acontecimentos tenham lugar depois 'da fuga do país' do primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior (há duas semanas em Portugal), do presidente interino, Raimundo Pereira, e do ministro da Defesa, Artur Silva (ambos em França). A mesma fonte frisou não haver 'razões plausíveis' para essas ausências, justificadas com motivos pessoais.
Quanto aos alegados golpistas, a fonte lembrou que não há referência a meios militares envolvidos e frisou que Baciro foi assassinado em casa, enquanto Proença, alegado líder do golpe, foi morto quando regressava ao país. Os militares mataram ainda o motorista e o segurança pessoal do ex-ministro.
Faustino Imbali, antigo primeiro-ministro e aliado de Kumba Yalá, foi também dado como morto, mas a Liga Guineense dos Direitos Humanos afirmou que foi ferido e que está sob custódia militar, 'em local seguro'.
O governo manteve ontem uma reunião de emergência para analisar a situação.



PERFIS


APONTAMENTOS
CONDENAÇÃO
A França condenou 'firmemente' os assassínios e exigiu às autoridades guineenses o apuramento das responsabilidades.
APURAR FACTOS
A presidência portuguesa da CPLP apelou ao 'rigoroso apuramento dos factos' e instou os militares para que mantenham 'segurança e ordem'.
APELO À CALMA
A ONU apelou à calma na Guiné, de forma a que 'o processo eleitoral e a ordem constitucional não sejam postos em causa'.
CRONOLOGIA
23 NOVEMBRO 2008
Nino Vieira sobrevive a ataques de soldados dissidentes armados com metralhadoras e granadas. Como consequência, o Ministério do Interior recruta um corpo de 400 membros para a guarda presidencial.
4 JANEIRO 2009
Milícia dispara perto de um local onde estava o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, Tagmé Na Waie. Militares dizem que este era o alvo e a guarda que tiros não foram intencionais.
1 MARÇO 2009
Na Waie é assassinado durante um ataque contra o quartel-general das Forças Armadas. Uma bomba accionada à distância mata o general.
2 MARÇO 2009
Nino Vieira é assassinado num aparente ataque de retaliação. Com os militares nas ruas, é atacada a sua residência privada.
1 ABRIL 2009
As eleições presidenciais na conturbada Guiné-Bissau são marcadas para o próximo dia 28 de Junho.


PORTUGAL APOIA FORÇA MILITAR
Portugal está disposto a apoiar o envio de uma força regional de interposição para a Guiné-Bissau, declarou ontem em Washington o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado.
Falando após uma reunião com a secretária de Estado norte-americana Hillary Clinton, o ministro afirmou que Portugal vê 'com muita preocupação' a situação na Guiné-Bissau. O Governo português 'tomará posições brevemente', em conjunto com os outros países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). Interrogado sobre se Portugal apoiaria o envio de uma força da CPLP para a Guiné-Bissau, Luís Amado afirmou que 'não há acordo sobre uma força de interposição'.
'Há, do meu ponto de vista, condições para, no âmbito do que foi decidido pela CEDAO [Comunidade de Desenvolvimento Económico da África Ocidental] e União Africana, haver uma força da ONU ou da União Africana', acrescentou. Portugal 'poderia apoiar essa força', mas não vê como 'oportuna' a participação de 'uma força específica da CPLP'. 'São as organizações regionais que têm responsabilidades directas em relação à situação de conflito', referiu o chefe da diplomacia lusa.
O secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, João Gomes Cravinho, defendeu, por seu turno, a realização das eleições presidenciais marcadas para o próximo dia 28.

PROCURADOR FALA EM FALHAS NAS INVESTIGAÇÕES
A alegada tentativa de golpe de Estado na Guiné-Bissau ocorreu um dia depois de o procurador-geral da República daquele país, Luís Manuel Cabral, ter afirmado que existem dificuldades na audição de pessoas no âmbito das investigações aos assassinatos do presidente Nino Vieira e do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, Tagmé Na Waie.
'Estamos a fazer o nosso trabalho, mas há dificuldade em termos de resposta, para que as pessoas possam ser ouvidas', declarou. 'Na semana passada a PJ passou um ofício para ouvir dois deputados. Já ouvimos um e falta ouvir outro que, neste momento, não se encontra no país', acrescentou.

(Loureiro dos Santos, General na reserva, ex-CEME)
'OS MILITARES REFORÇAM PODER'

Correio da Manhã – Que significado têm os últimos acontecimentos na Guiné?
Loureiro dos Santos – Há só uma certeza: a liquidação destes indivíduos reforça o poder dos militares. O sucessor de Tagmé Na Waie consolida o seu poder ao afastar figuras que tentaram, ou poderiam vir a tentar, fazer um golpe de Estado.
– A Guiné é um Estado falhado?
– É um país instável. Há grupos rivais, ligados, de uma ou outra forma, aos militares, que se vão substituindo no poder pela violência.
– Acresce a isto o tráfico...
– Sim. O tráfico ocupa espaços propícios à corrupção, no vazio da autoridade estatal, e isso associa-se às lutas entre gangs, alguns deles ligados ao poder político.
– Será tempo de enviar uma força de paz para a Guiné?
– Parece ser a solução. Mas a força deve ser da União Africana. Com apoio da ONU, mas composta por militares de estados africanos.
– Cabe a Portugal liderar esforços para o envio dessa força?
– Portugal não deve, isoladamente, ter a iniciativa. Mas deve, na CPLP e na ONU, obter apoios para que a União Africana leve a cabo uma eventual acção de força.

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