terça-feira, 3 de março de 2009

NOTÍCIAS







Bissau: Atentados agravam instabilidade política e social
Presidente Nino Vieira assassinado
A Guiné-Bissau está de novo a ferro e fogo. Em cima das 19h30 de domingo, uma bomba accionada à distância no quartel-general da capital mata o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, general Tagmé Na Waie. As horas que se seguiram ao assassinato foram dramáticas. Com os militares já nas ruas e as rádios silenciadas, é lançado às 04h00 um ataque à residência privada de Nino Vieira.
Segundo fontes contactadas pelo CM, um comando oriundo de Mansoa, localidade a 80 quilómetros de Bissau, levou a cabo a retaliação pela morte de Na Waie e abate Nino Vieira com várias rajadas de metralhadora. A residência foi bombardeada com tiros de morteiro RPG e o presidente estava já na rua, em fuga, quando foi abatido. Nessa altura, carros da embaixada angolana em Bissau estavam junto à casa de Nino para o recolher. A mulher deste, Isabel Vieira, ainda conseguiu sair. O presidente tentou também a fuga em direcção aos veículos. Em vão. Fontes contactadas pelo CM asseguram que Nino foi varrido com os tiros de metralhadora. Pouco depois a sua morte era oficialmente anunciada e os militares juravam fidelidade ao poder político. Todas as fronteiras do país foram encerradas.
A rivalidade entre Nino Vieira, de etnia papel, e Na Waie, balanta, degradou-se nos últimos tempos. Depois de um passado de falsas amizades os dois homens mais poderosos do país mantinham uma relação artificial desde que Nino Vieira regressou a Bissau em 2005 após um exílio de seis anos em Portugal. Na Waie terá dito várias vezes em círculos fechados que o seu destino e o de Nino estavam ligados e que se ele morresse Nino morreria também.
A este passado turbulento juntou-se um dado novo: a Guiné tornou-se numa placa giratória para o tráfico de droga da América Latina que chega à Europa, tendo sido considerado pela ONU como um "narcoEstado". Os interesses à volta do contrabando de droga terão contribuído para o aumento das tensões entre Nino e Tagmé.


PERFIS
NINO VIEIRA
O mítico comandante da guerrilha, que nos 12 anos de Guerra Colonial na Guiné pôs o Sul do território a ferro e fogo, morreu de arma na mão, mas sem honra: acabou como ‘capo’ de um Estado corrupto. João Bernardo Vieira nasceu em Bissau a 27 de Abril de 1939. Fez parte do grupo de dez guineenses escolhidos por Amílcar Cabral, fundador do PAIGC, para receberem treino militar na China. Quando a guerra começou, em 1964, mandou no Sul, onde as tropas portuguesas passavam as piores provações. Após a independência foi chefe das Forças Armadas. Depôs Luís Cabral em 1980 e foi presidente. Foi deposto por Ansumane Mané em 1999. Refugiou-se em Portugal. e regressou a Bissau em 2005, sendo eleito presidente. Em todos os mandatos conseguiu suster golpes de Estado. A sorte que tantas vezes o protegeu, abandonou-o ontem.

TAGMÉ NA WAIE
Torturado – De etnia balanta, Tagmé Na Waie era CEMGFA desde 2005. Terá sofrido na pele a tortura do regime de partido único de Nino Vieira. Quando o general tentava a afirmação dos militares balantas foi brutalmente espancado e os testículos foram esmagados. Tagmé ficou do lado da Junta de Ansumane Mané em 1998/99e confessou que o objectivo era matar Nino Vieira.

RESGATE PÕE A NU FALTA DE MEIOS
É um dos cenários mais treinados pela Marinha. O resgate de portugueses apanhados numa crise militar na Guiné-Bissau está planeado há muito (ocorreu em 1998 e esteve iminente em 2005) mas emperra nos cinco dias de viagem (mais dois de preparação) que a força naval demoraria a atingir o país e na falta de meios: há apenas uma fragata disponível e Portugal ainda não tem um navio polivalente (com hospital e capaz de embarcar mais de 600 pessoas). A operação teria de contar com ajuda de países amigos ou navios mercantes. O Governo não tinha ontem ainda activado o plano de contingência.
Caso a situação na Guiné se deteriore e seja necessário avançar, ficam a nu as debilidades da Marinha de Guerra. A Força Naval Permanente, pronta a zarpar do Alfeite em 48 horas, conseguiria mobilizar apenas uma fragata, a ‘Corte Real’, uma vez que a ‘Álvares Cabral’ está em missão da NATO (em exercícios na Sicília) e a ‘Vasco da Gama’ em manutenção. A ‘Bartolomeu Dias’, a mais recente aquisição da Marinha, está ainda em treinos entre a Holanda, França e Reino Unido.
Com a ‘Corte Real’ (onde poderiam ser embarcados dois helicópteros) seguiriam mais uma ou duas corvetas e o reabastecedor ‘Bérrio’. Nesses navios iriam fuzileiros, entre eles de Operações Especiais, médicos e mergulhadores.
O navio polivalente que a Marinha tem prometido desde 2004 poderia, só ele, embarcar mais de 600 pessoas. Mas como ainda não saiu do papel, Portugal teria de pedir ajuda a países amigos (nomeadamente da CPLP) para assegurar o resgate ou, como em 1998, solicitar o auxílio a navios mercantes a operar na zona: nessa operação foram resgatadas 1237 pessoas de 33 nacionalidades, com o auxílio do mercante ‘Ponta de Sagres’.
Portugal poderia ainda mobilizar um pelotão de operações especiais do Exército, uma companhia de pára-quedistas e pelo menos um C130 da Força Aérea – estes só poderiam aterrar na Guiné após a situação ter estabilizado (o aeroporto de Bissau fica perto de vários quartéis militares).

NINO INTERCEDEU A FAVOR DE TRAFICANTE
Ousame Conté, o filho mais velho do ex-presidente da Guiné-Conacri Lansana Conté, falecido em Dezembro, admitiu recentemente ligações ao narcotráfico, após ter sido detido por suspeita de envolvimento no caso de um avião que transportava cocaína e dinheiro proveniente da Guiné--Bissau, em Abril de 2007.
Graças à intervenção de Nino Vieira, grande amigo e aliado do seu pai, Ousame Conté foi libertado. Contudo, após a morte do pai e depois de a Junta Militar ter assumido o poder em Conacri, o nome de Ousame Conté veio à baila quando suspeitos de tráfico de droga estavam a ser interrogados por militares. Foi citado por estar envolvido num caso de tráfico de droga que ocorreu em Agosto de 2008, após a aterragem em Boké, Conacri, de um pequeno avião que transportava 840 quilos de cocaína e dinheiro proveniente de Bissau. Na sequência de investigações conduzidas pelos militares, foram detidos o presidente do município de Boké, o governador da região e o director regional de segurança. Ousame Conté está detido no quartel--general da Junta liderada pelo capitão Mussa Dadis Camará, no poder no país desde a morte de Conté a 22 de Dezembro de 2008.

COMUNIDADE PORTUGUESA "ESTÁ CALMA"
"Está tudo bem com os portugueses. A situação está calma, mas é preciso ter cuidado. Existem muitas barreiras de segurança", declarou ontem ao CM José Pinto, um mecânico de 50 an os residente na Guiné-Bissau há pouco mais de dois anos. "Resido em São Vicente, a 50 km da capital, mas tenho colegas que vieram de Bissau e me disseram que não há problema algum", acrescentou. Também o secretário de Estado das Comunidades, António Braga, garantiu que a comunidade portuguesa – 2500 com dupla nacionalidade e 300 lusos – está "calma e tranquila". O primeiro--ministro José Sócrates pede aos cidadãos nacionais "que reajam com serenidade", salientando que "o Governo acompanha com detalhe a situação".















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