terça-feira, 14 de abril de 2009

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Entrevista com Mari Alkatiri

Timor-Leste pretende colocar a sua experiência ao serviço da Guiné-Bissau

O ex-primeiro-ministro timorense Mari Alkatiri declarou hoje ao PÚBLICO, em Lisboa, que Díli pretende colocar ao serviço da Guiné-Bissau a sua experiência no campo da delimitação de fronteiras e do melhor aproveitamento possível no aproveitamento dos recursos petrolíferos, comum aos dois países.
“Não é estranho eu seguir quarta-feira para Bissau como enviado especial de Timor-Leste. É normal noutros países, designadamente os de tradição anglo-saxónica, recorrer-se ao chefe da oposição para determinadas missões. Oponho-me ao Governo e não ao Estado”, explicou o secretário-geral da Fretilin, antes de ser recebido pelo ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, como delegado do Presidente José Ramos-Horta para a questão guineense.
“Primeiro tinha aceite encarregar-me do dossier do Mar de Timor, mas como no Governo levantaram problemas a escolha ficou sem efeito. Mas desta vez tenho uma base de apoio forte. Houve unanimidade na minha escolha para enviado especial à Guiné-Bissau”, acrescentou Alkatiri, que durante as próximas semanas tenciona colocar ao serviço dos guineenses a sua experiência de coabitação com a comunidade internacional.
“É preciso saber como lidar com todos, consolidar e estabilizar um país. É preciso ter coragem de aceitar os desafios; e nós ainda não sofremos com a crise internacional, dada a nossa vivência no processo negocial”, disse o ex-primeiro-ministro, em cujo entender as experiências timorenses na definição de fronteiras e no aproveitamento dos recursos petrolíferos poderão ser úteis à Guiné-Bissau, que tem lençóis de hidrocarbonetos tanto no mar como em terra, junto às linhas de delimitação com o Senegal.
“Conheço bem os PALOP e a Guiné-Bissau é um caso único, pois que ao partir da base de dois estados com um mesmo partido a geri-los, o PAIGC, ia ser difícil. Cabo Verde ainda teve a sorte de poder contar com os seus quadros, com os seus recursos humanos; mas na Guiné foram crises atrás de crises, até se atingir o pico com o assassínio do Chefe do Estado-Maior e do Presidente Nino Vieira. Não acredito que vá continuar a viver neste círculo vicioso. São precisas reformas; é necessária uma ajuda internacional do tipo Plano Marshall”, prosseguiu Alkatiri, que numa primeira fase vai estar 10 dias em Bissau, acompanhado pelo antigo ministro Roque Rodrigues e por mais três elementos.
“O sonho de Amílcar Cabral foi genial, mas creio que se continuasse vivo não seria nunca chefe de nenhum dos estados por cuja independência lutou. Ficaria só como chefe do partido. É sempre muito difícil a passagem de um período revolucionário para o da gestão do Estado. Mas Timor-Leste já beneficia agora de um conjunto de quadros da nova geração. Precisamos de reintroduzir a língua portuguesa e de reforçar o ensino do tétum. Dentro de 20 anos os timorenses serão poliglotas, dominarão quatro línguas: estas duas mais o inglês e o bahasa indonésio”, continuou este político de 59 anos, que quer ver o seu país a competir no mercado regional.
“Daqui a quatro anos vamos ter um milhar de médicos, 700 deles formados em Cuba e os restantes no próprio país. Para além de cobrir as nossas necessidades, poderemos ajudar o Norte da Austrália e a Indonésia”, pormenorizou, em relação a um dos campos em que Timor-Leste está a conseguir fugir ao subdesenvolvimento.
Já quanto ao seu relacionamento com o Governo de Xanana Gusmão, que reconhece “de facto” e não de direito, prefere não falar enquanto tiver a seu cargo esta missão de acompanhar, por um período ainda indefinido, a caminhada da Guiné-Bissau para as presidenciais, cuja primeira volta está marcada para 28 de Junho

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